24 de Fevereiro de 2018
“Eu cheguei às 8:00h e fui rezar junto ao sacrário na casa da Missão Mãos Erguidas. Estavam lá duas senhoras que tinham passado a noite em vigília de oração. Uma delas saiu a seguir, mas a Leonor Sousa veio para a rua fazer missão comigo até às 10h30. Eu admiro-a muito por ter passado a noite inteira a rezar e ainda ter forças para a seguir vir para a rua falar durante horas com as pessoas que entram na clínica dos Arcos. Abriram a porta da clínica cerca das 8h17. Antes da porta abrir tinham-se juntado ali cinco mulheres algumas com acompanhantes, à espera que a porta abrisse. Isto é o que costuma acontecer nos dias de maior movimento em que fazem abortos, às terças, quartas e quinta-feiras. A maior parte dos empregados só chega mais perto das 9h (nós ali na rua vemo-los chegarem e entrarem pela porta de serviço que fica um pouco mais acima) mas desde há um ano que a primeira empregada a chegar, que mora num prédio em frente, entra na clínica às 8h15 e vai logo abrir a porta principal para que os clientes não esperem na rua. É dos momentos mais difíceis para nós, em que temos de falar com quem lá está, e muitas vezes alguém reage mal, à frente de todos. Foi o que se passou neste dia. Uma senhora reagiu mal comigo. Quando é assim eu procuro não insistir e ir falar com as outras. Algum tempo depois de entrar essa senhora veio outra vez cá para fora e a Leonor Sousa e eu fomos de novo falar com ela. Tentámos dissuadi-la de fazer o aborto apelando à beleza que é ter um filho e à beleza do amor entre mãe e filho(a). Reagiu de novo muito mal. Apelámos ao coração dela lembrando o amor que a mãe dela deveria ter tido por ela. Aí ela desfere uma série de insultos contra a própria mae, que tinha tido 8 filhos de 8 homens e que os filhos foram criados com tantas dificuldades materiais que mais valia que a mãe os tivesse abortado. Esta atitude de dizer mal da própria mãe é rara e reflete a pertubação e dureza de coração em que esta mulher deve estar. Entretanto chegou o Afonso, éramos agora 3 na rua, e é sempre muito bom termos a companhia de um jovem. Falámos com muitas mulheres, com os homens acompanhantes. Muitos nao pararam. Uns vinham ainda para a primeira consulta, e ficaram de pensar. E nós íamos rezando os terços, que é a arma que nos aguenta ali. Perto das 11h, sobe a rua um grupo de 3 pessoas, uma jovem abraçada a um rapaz, e uma senhora que me disse depois que era a mãe dele. Eu começo a falar e eles durante algum tempo estão calados a ouvir. Digo o que sei e peço ajuda a Jesus e a Nossa Senhora, que me inspirem. Dizem então que ela já vem para abortar nesse dia, que já tinha feito a ecografia na semana passada, que estava de 7 semanas, que o rapaz e a mãe dele nao queriam que ela abortasse, mas respeitariam a decisão que ela tomasse, mas a mãe dela tinha-lhe dito para ela abortar, e ela tinha 20 anos e vivia com a mãe, além disso tinha medo de prejudicar os estudos e chumbar o ano por causa da gravidez. Eram pessoas tímidas. Durante a conversa a rapariga várias vezes chorou e continou sempre abraçada ao namorado. Percebia-se que o maior medo era o de enfrentar a mãe dela. Usei todos os argumentos de que me lembrei, que a mãe dela depois do bebé nascer mudaria logo de opinião e que se iria deliciar a ajudar a tratar dele, como todas as avós são. Tentei levá-los ao PAV, para que ouvissem as ajudas sociais que há para lhes dar, um deles até conhecia alguém que tinha sido ajudado por eles, mas não quiseram. Dei-lhes todos os nossos contatos, folhetos e dvd, e também o do PAV. Estes momentos para mim pareciam uma eternidade que não acabava, era preciso evitar que ela entrasse na clínica porque o aborto estava marcado para aquela hora. Por fim lá decidiram voltar para trás, não abortar e ter o bebé, e eu fiquei a vê-los descer a rua até os perder de vista. Foi uma enorme alegria para mim. Fui para junto do sacrário agradecer a Jesus e a Maria as suas graças que permitiram salvar este bebé. Mas peço a todos ainda orações por este bebé, por esta mãe, por este pai e avós, porque a rapariga ainda vai ter de enfrentar a sua mãe, a pressão sobre ela vai ser muito grande, e até às 10 semanas ainda pode abortar. Nesta quinta-feira ainda tivemos Eucaristia às 13h no oratório da Missão Mãos Erguidas. Louvado seja Deus.Paulo Freire”